Foto por Asih Wahyuni
A temperatura arrefece e, com ela, começa uma nova jornada para os jovens portugueses. O vento uiva, as folhas amarelecem e iniciam a sua viagem até ao chão. O início de um novo ano letivo é sempre marcante para qualquer estudante: representa desenvolvimento pessoal, um novo passo na nossa aprendizagem enquanto seres humanos. Novas disciplinas, professores e, talvez, novos amigos que se juntam aos que já temos. É precisamente aqui que se constroem as bases daquilo que somos verdadeiramente.
Lembro-me de quando mudei de ciclo. Foi uma experiência assustadora: tudo novo, tudo desconhecido. Ainda não era o “eu” de hoje, mas já mostrava curiosidade pelos livros. A minha mãe já me tinha oferecido vários livros de contos e eu já tinha visitado uma editora com a escola. Motivações não faltavam; precisava apenas de um “clic” em mim.
Tive esse momento na biblioteca dessa nova escola. Queria conhecer o novo ambiente, explorar aquele ecossistema cheio de espécimes novas, cada um com a sua plumagem única. Deparei-me com a biblioteca logo no início. Ficava no segundo andar de um edifício, mesmo por cima da sala dos professores. Conheci cada recanto do espaço e maravilhei-me com uma árvore feita de papel e tinta, era enorme! Quase tocava o teto. Por baixo dela, estavam montes de pufes. Passei muitas horas de almoço ali.
Foi numa dessas horas vagas que encontrei Jane Austen pela primeira vez. Tentei ler Emma, mas foi demasiado desafiador para a minha idade. Gostava do desafio mental e, por isso, depois tentei Orgulho e Preconceito. Consegui ler, mas fiquei confusa com aquela combinação difícil de palavras, embora fossem lindas.
Porém, mesmo ao lado, na estante, possivelmente mal colocado por algum aluno, estava Harry Potter e a Pedra Filosofal. A partir daí, foram só cores e confusões de palavras bem ordenadas. Desenvolvi um vício por mundos fantásticos. Seguiram-se os Irmãos Grimm e, depois, Percy Jackson. Tornei-me uma devoradora de mundos.
Insaciável de leitura, provavelmente li a secção inteira de literatura fantástica daquela biblioteca. Devo ficar muito grata a esse lugar. Ajudou-me a definir o meu amor pelas palavras e a perceber que era naquele ambiente rodeado de livros que queria passar o resto da minha vida. Ainda hoje luto por esse futuro, e aqui estou, a escrever para vocês.
Imagino que agora, neste exato momento, por entre corredores cheios e apressados, encontra-se um estudante, assustado como eu estava, diante da porta da biblioteca escolar. Fascina-se com as prateleiras altas e coloridas, com tantos títulos, com o cheiro do papel, com a criatividade que paira no ar ainda aquecido pelas brisas do verão que se despede. A biblioteca é um espaço onde o conhecimento parece infinito — ele sabe-o, ou melhor, sente-o. É ali que, um dia, quase por acaso, decide pegar num livro, folheá-lo e, depois de refletir, requisitá-lo para ler.
Foram muitas as bibliotecas onde leitores ávidos descobriram o prazer único que só um bom livro pode proporcionar em toda a sua plenitude. Hoje, não venho falar de cada um desses estudantes — ainda que eu seja um deles — nem dos benefícios da leitura no quotidiano, pois todos conhecemos um pouco disso também. Venho, sim, anunciar algo maior: este é o mês internacional das Bibliotecas Escolares.
Vetor por Upklyak
A International Association of School Librarianship (IASL), fundada em 1971, lançou a iniciativa de celebrar, em outubro, o papel e a dedicação dos(as) bibliotecários(as) escolares. Mas porquê outubro? O que tem este mês de tão especial?
Trata-se, sobretudo, de um planeamento estratégico: coincide com o início do ano letivo e, através desta celebração, os alunos podem familiarizar-se desde cedo com o ambiente da biblioteca. Esse contacto precoce não só os integra num espaço de aprendizagem e convívio, como também lhes incute bons hábitos e fornece recursos fundamentais para o sucesso em avaliações, trabalhos académicos e projetos futuros.
Apesar de já existir uma organização internacional, estes órgãos educacionais portugueses só ganharam verdadeira expressão com a criação, em 1996, da Rede de Bibliotecas Escolares, fruto de uma iniciativa conjunta dos Ministérios da Educação e da Cultura da época. Com o tempo, o dia 27 de outubro passou a assinalar, em Portugal, o Dia da Biblioteca Escolar. O impacto internacional dessa valorização foi tal que, a partir de 2008, a IASL decidiu prolongar a comemoração ao longo de todo o mês de outubro, enriquecendo-a com atividades diversificadas e inovadoras, capazes de atrair desde os mais pequenos até aos mais crescidos, aproximando toda a comunidade educativa e literária que circula nesses espaços.
Ao longo desse mês, escolas e bibliotecas multiplicam iniciativas para divulgar a importância destes espaços e incentivar a participação de alunos e pais. Muitos agrupamentos apostam ainda na vertente artística, promovendo cartazes e materiais de divulgação. No fim, todas estas ações convergem num mesmo objetivo: reforçar a biblioteca como espaço de cultura, conhecimento e partilha.
Todos os anos, é escolhido um mote que orienta projetos e atividades. Já houve temas como “Descobrir caminhos para a saúde e o bem-estar”, que promoveu a saúde emocional, mental, social e física dos alunos; ou “Contos de Fadas e Contos Tradicionais de Todo o Mundo”, que levou os estudantes a mergulhar nas tradições culturais através das artes, do teatro e da leitura. Em 2022, o tema “Ler para a Paz e Harmonia Globais” motivou rodas de leitura e diálogo entre crianças; em 2023, com “O Meu Lugar Preferido para Criar e Imaginar”, os alunos deram largas à imaginação em histórias, leituras e vídeos; já em 2024, a temática “Bibliotecas Escolares a Ligar Comunidades!” destacou a biblioteca como ponto de encontro e união.
Este ano, o mote escolhido é “Para além das estantes: IA, bibliotecas e o futuro das histórias”. No site oficial da Rede de Bibliotecas Escolares, foram sugeridas diversas atividades adaptadas aos diferentes níveis de ensino: desde a análise de histórias já existentes na biblioteca e a sua comparação com versões criadas por inteligência artificial sobre o mesmo tema, até à reflexão em torno de uma questão provocadora — poderá a IA ser também considerada uma escritora? Este tema, projetado para o futuro, convida a um estudo mais aprofundado sobre uma discussão que tem agitado a nossa sociedade: a da criatividade humana e o facto de já não sermos os únicos a possuí-la.
No fundo, todas estas iniciativas representam uma verdadeira conquista cultural, porque conseguem reunir professores, alunos, pais, encarregados de educação e, claro, os incansáveis bibliotecários com uns seus “Shhhiu!!...” habituais, em torno de uma ideia simples, mas poderosa: mostrar o quanto a biblioteca pode ser útil e inspiradora. Estes espaços não são apenas estantes repletas de livros; são lugares onde a criatividade floresce, onde se desenvolvem competências, onde se aprende a pensar de forma independente e onde a cultura se torna acessível a todos.
Celebrar o Mês Internacional das Bibliotecas Escolares é, por isso, muito mais do que assinalar uma data no calendário. É uma oportunidade de reconhecer a biblioteca como motor de crescimento, capaz de estimular o espírito crítico e a imaginação, e de preparar crianças e jovens para os desafios do futuro. E, convenhamos, não há melhor forma de o fazer do que com atividades criativas, dinâmicas e cheias de vida.
Assim, todos os anos, em outubro, os jovens são convidados a conviver e a explorar este mundo feito de palavras, descobrindo universos inteiros onde a literatura escolheu criar raízes — exatamente naquelas mesmas prateleiras altas que mencionei no início deste texto, onde, inesperadamente, um aluno decidiu dar uma oportunidade àquela “elegante confusão de letras” e, simplesmente, ler um livro.
Foto por zinkevych
Depois de explorarmos o significado e a importância do Mês Internacional das Bibliotecas Escolares, é tempo de pôr mãos à obra e transformar essa celebração em algo de se lembrar. Embora outubro seja um mês repleto de iniciativas promovidas pelas bibliotecas escolares, há sempre espaço para que famílias e educadores se juntem a esta festa dos livros. Afinal, a leitura ganha outra magia quando partilhada, seja ela numa sala de aula ou talvez no conforto do sofá em casa.
Assim, para acompanhar este artigo que enfatiza a celebração mundial das bibliotecas, deixamos algumas ideias simples e divertidas, divididas em duas listinhas, que podem ser desenvolvidas tanto por educadores como por pais. O importante é manter viva a curiosidade, o prazer de descobrir histórias e a vontade de criar memórias à volta dos livros.
Atividades para Educadores
(na escola ou na biblioteca)
Passaporte Literário:
Cada leitura é uma viagem, então por que não a registar? Os alunos podem criar um “passaporte” onde recebem um carimbo por cada livro lido. Através desta ideia, tu podes escolher as obras, com base na faixa etária indicada. Nesse caso recomendo vivamente que visites o nosso site onde apresentamos uma boa seleção de livros para os mais novos e com muitas coisas novas por vir!
Cartas das Personagens ao Autor: Nesta atividade, cada aluno escolhe um livro e, fingindo ser a personagem principal ou outra figura de interesse, escreve uma carta ao autor. Pode perguntar, por exemplo, porque é que a história acabou daquela forma ou criar um final alternativo. Então!.... Vamos lá treinar as nossas redações de forma criativa!
Retratos e Biografias Literárias:
Os alunos podem desenhar uma personagem tal como a imaginam ou escrever uma biografia baseada nas pistas do livro. É uma excelente forma de unir arte, imaginação e leitura, tudo de forma educativa e divertida.
Encontro com Autores e Ilustradores:
Uma visita de um autor ou ilustrador é sempre um momento mágico! Para aproveitar ao máximo, os alunos podem preparar perguntas, estudar a obra, escrever poemas inspirados nas histórias e até criar capas alternativas dos livros. Caso esta ideia te chame à atenção, entra em contacto connosco! Podemos agendar algo giro para os teus alunos.
Clube de Leitura:
Falar sobre livros é quase tão bom como lê-los. Antes da leitura, podem discutir o título e as expetativas; depois, partilhar opiniões e emoções. Discutir sentimentos é um processo essencial para a boa formação de uma criança, então procurar conversar sobre como o livro nos faz sentir é uma boa maneira de colocar isso em prática.
Atividades em Família
(em Casa)
Oficina de Escrita Criativa em Família:
Pais e filhos podem inventar histórias juntos, misturando personagens conhecidas com ideias novas. No fim, podem ilustrar e montar um pequeno “livro de família”. Comecem por cada um criar personagens, com os seus feitios e cores e depois tentem juntá-los! O que estas personagens fariam juntas? Que aventuras iriam desbravar?
Hora da Leitura em Família:
Reservem um momento tranquilo para ler juntos — pode ser antes de dormir, ao fim de semana ou num domingo chuvoso. O segredo é ler devagar, com emoção, e deixar o texto ser o protagonista.
Troca de Livros em Família:
Cada membro escolhe um livro que adorou e recomenda-o a outro. Depois, conversam sobre o que sentiram e o que mais gostaram. Seria quase como um clube do livro em família, só que com empréstimos de livros! Não há nada melhor que partilhar as coisas que gostamos com quem mais amamos.
Cinema Literário:
Escolham um filme baseado num livro e comparem as duas versões. O que mudou? Qual gostaram mais? Há sempre algo novo a descobrir. Mas aqui entre nós, o livro vai ser sempre melhor, não é?
Caça ao Tesouro Literário:
Espalhem pistas pela casa, todas inspiradas em livros ou personagens. Quem resolver o enigma final encontra… um novo livro para ler juntos!
Vetor por Grmarc
Celebrar o poder das histórias é uma forma de nos ligar, de aprender mais um pouco e nos fazem sonhar. Seja na escola, na biblioteca ou no conforto de casa, o importante é manter viva a curiosidade e o amor pelos livros.
Porque, no fim das contas, as melhores histórias são sempre as que partilhamos com os outros.
E tu, vais fazer alguma atividade?
Partilha connosco!
Cristiana Nunes
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